A fantasia é um dos conceitos centrais na psicanálise, tida muitas vezes como a lente psíquica de como enxergamos o mundo e os outros. Todos os nossos desejos e ações são uma consequência dessas fantasias. Elas são a forma como enxergamos e muitas vezes distorcermos a realidade. Aliás, existe uma visão da realidade que seja pura e não corrompida? A própria noção de realidade implica em fatores subjetivos e interpretativos, visto que não existe uma realidade, mas realidades.
Dentro desse universo da fantasia existem os típicos exemplos em que uma pessoa passa a fantasiar com sua alma gêmea e é surpreendida quando essa fantasia é atravessada, isto é, diluída pela aproximação com a realidade. Os apaixonados são envolvidos na fantasia e a prova disso é a evidência de que a paixão provoca efeitos de modificações neurológicas na mesma medida que uma droga pode provocar no cérebro, distorcendo a realidade. A paixão tem sua expectativa de vida de até mais ou menos 2 anos e pode provocar euforia e distorção da realidade no apaixonado.
O mais interessante é que a fantasia determina nossas admirações por outras pessoas. O artista e nossos ídolos são os principais objetos de nossas transferências positivas. E por que o artista? O artista está na posição de intocável e distante! É essa posição que nutre e faz a manutenção de nossas fantasias: a distância. Aquele que é conhecido, torna-se desinteressante de certa forma, pois a áurea de fantasia que ele provoca aos outros é dissolvida.
Entretanto, essa fantasia que temos das pessoas mais íntimas não é dissolvida inteiramente. Nenhuma fantasia é dissolvida plenamente, mas apenas varia em grau. A dissolução ocorre apenas no caráter extremamente irreal, distante e subjetivo dessa fantasia, fazendo com que a paixão acabe e com que seja hora de cultivar um amor mais sólido, que não se baseie no frenesi e em sentimentos fortes pelo cônjuge, mas numa construção diária e mais realista da imagem do cônjuge.
Em relações de intimidade, a autoridade esmorece: muitos casais não ouvem a si mesmos, dando razão à opinião de um terceiro (distante) e detrimento do cônjuge ou parente. O marido pode falar por 20 anos um comportamento que enxerga na esposa e trazer uma possível solução. Mas ela provavelmente ouvirá melhor sua terapeuta ou um terceiro que pontua o mesmo comportamento retratado pelo marido. O que houve nesse caso? A autoridade de convencimento foi exercida por alguém distante, pouco conhecido ou que possui um papel de menor intimidade. Essa relação faz com que a mulher desenvolva a fantasia de que esta pessoa de fora é mais apta para aconselhá-la, menos corruptível e mais imparcial. O mesmo ocorre entre filhos adolescentes que preferem ouvir seus colegas descolados do que os pais bregas e desantenados.
O psicólogo, psicanalista, médico, professor, etc... encarnam arquétipos de autoridade e distância, causada pelo papel social de profissional. Desta forma, seu filho(a), esposa(o), pai/mãe, irá creditar, na maioria das vezes, maior credibilidade a eles dentro de cada contexto específico, por mais que você tenha proximidade e intimidade com esta pessoa.
-Gabriel Meiller
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