Quero agradecer em primeiro lugar ao cristianismo. A religião cristã e eu somos muito íntimos de certa forma. Quem disse que religião estraga o homem? Este alguém está certíssimo; mas depois de estragá-lo com o senso de justiça/vingança, com as repressões aos prazeres e conhecimentos terrenos... depois de aterrorizá-lo com o medo do inferno ou com a culpa infernal... a religião o ensina a valorizar a vida!
O cristianismo me escravizou para depois me libertar; me ensinou o que não fazer e o que fazer. Meu carrasco é meu salvador. Nesta relação mazoquista eu aprendi a amar este algoz abusador. Os homens fortes são aqueles que se permitem endurecer diante dos agressores e superarem a ele na luta da vida.
Fui privado do conhecimento terreno antes; após a libertação o busquei de todo o coração, alma e entendimento. Fui privado do sexo e então me afundei nele; entretanto, este efeito rebote, esta antítese que criei me ensinou o caminho do meio.
As antíteses são necessárias para compensar uma tese deveras reforçada. Os que entendem a dialética hegeliana sabem do que falo.
Durante os últimos seis anos eu fui a antítese do cristianismo, do sistema de fé que impõe valores universais e esmaga as individualidades.
Aos que são cristãos e estão contentes, certamente não falamos do mesmo cristianismo. Mas aos que se identificam com o que estou dizendo, sabem exatamente do cristianismo que estou falando.
Nesta antítese de seis anos eu virei um laboratório e minha própria cobaia, bem como meu próprio analista, cientista e salvador. Eram problemas que somente eu resolveria em uma meditação interior, ruminadora. Os excessos hedonistas foram instintivos após a jaula da minha alma se abrir. Eu queria experimentar de tudo um pouco, tudo que era lícito ou que pelo menos não era deveras horrendo e psicopatológico. Então com a melhor professora, isto é: a vida e suas consequências eu consegui tirar minhas próprias conclusões dos excessos.
Diferente daquele não nascido na opressão e que se contenta com a zona média, nasci no raso e naveguei para as profundezas da alma. Não é orgulho arrogante o que escrevo, muito menos falsa humildade. É minha autoanálise diante do que vivi e com quem convivi, diante da média ponderada dos que observei. E posso concluir: o que faz um homem, em parte, é o aprendizado que este tira do sofrimento, é a vontade de potência que ele desenvolve quando os empecilhos da vida instigam esta vontade a aumentar para atingir seus objetivos.
Ao meu mais brilhante e carrasco professor por quem nutro uma destrutiva admiração e agradecimento não tanto mais raivoso: ao cristianismo meu mais profundo agradecimento! Como o escravo que beija a mão do senhor que o espancou e depois o jogou à liberdade, após este não ser mais útil para nada... ao cristianismo meu afeto, no sentido mais primitivo e etimológico da palavra "afeto".
-Gabriel Meiller
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