Em toda mesa de cabeceira de um ser humano pós-moderno existem catálogos de manuais sobre: como se deve viver, o que almejar, como se comportar e o que esperar da vida. Em um primeiro momento o serzinho ingênuo e iludido se felizarda com tal engenhosidade da contemporaneidade e entra em um descanso sabático existencial.
Dois empregos? Uma vida de hobbies, baladas regadas a alterações de consciência, carro importado ou nacional? Férias na Disney? Formação em direito, engenharia ou medicina? Viver de música e da arte?
O ser humano nasceu para adorar a Deus ou Deuses? O ser humano reencarna em outras existências? O ser humano é um sopro que logo se esvai e só resta a eterna escuridão e o fim da consciência?
Ser liberal ou conservador? Usar drogas ou viver pelas leis e regras morais? Ficar com vários ou namorar? Seguir alguma religião ou viver sem elas?
Para todas estas e outras perguntas existem mostruários de roupas existenciais, pensamentos e modos de ser. Diante destes mostruários cada mortal veste uma roupa e logo depois descarta; outros se identificam e não mais as trocam.
Mas atenção, muita atenção: o vendedor é um manipulador pertinente! Ele sugere peças de roupas por meio de artifícios engenhosos. As propagandas na mídia, os grupos sociais fechados, os influencers do youtube, a grande mídia... são o vendedor desenfreado. Mas acima de tudo: o surto coletivo da sociedade da positividade tóxica. "Produza, seja, faça, viva, escolha, exista!" De onde vem tudo isso??? Maldito Dasman! Maldita normatização!
E neste discurso a megalomania do homem da produtividade se torna um imperativo mais que categórico que escraviza o portador do manual na mesa de cabeceira.
"Como assim você não sabe o que quer? Tenho mil e uma opções para que você seja... ande logo! Se vista e diga o que achou!"
E assim o ser humano sai do mostruário pressionado, insatisfeito e em dúvida sobre o que escolheu! "Será que essa peça me serve mesmo? É a mais adequada?"
E então o vazio bate à porta... cresce de maneira avassaladora; as frustrações vêem à tona; o sentimento de confusão e de que não se sabe o que quer é crescente e profundo! Quem somos? Somos por que quisemos ou por que fomos coergidos a ser?
A construção do sentido da vida é pessoal e subjetiva, mesmo que em meio à exposição ao objetivo e ao coletivo-social. O ser que escolhe abandonar o manual da mesa de cabeceira, expulsar o vendedor apressado e manipulador, e averiguar, vestir, trocar, desfilar e usar o mostruário um a um... sai com a certeza (mesmo que ilusória) de que escolheu seus melhores looks.
Ah... a segurança de que a bendita "escolha certa" foi feita! Nada paga o preço desta sensação aconchegante; nada rouba a felicidade de uma vida bem vivida e saboreada pelos sentidos.
-Gabriel Meiller
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