Existem pessoas que na vida vão a esbarrar aqui e acolá; tateiam em busca de descobertas sobre o que há de significante e aprazível a deleitar-se. Alguns terminam tal caminhada existencial revestidos de uma carcaça pobre, resultante de nadismos e automatismos que foram a viver em tal monótono tempo de vida. Que foram a fazer estes? O padrão; nasceram, cresceram, se preocuparam com os aspectos basilares de suas épocas, como se aliar a um grupo social, emprego, corridas exaustivas atrás de promoções e especializações deste emprego; casar e ter filhos; ou idas frequentes em baladas e eventos semanais; o consumo de séries e filmes; a aposentadoria, a dedicação em cuidar dos netos e em arrumar a casa... e então aquele velho sentimento de um carro velho na garagem! Uma peça que já cumpriu seu tempo e sua função aqui na Terra e resta-lhe agora o túmulo e o fim da consciência.
É isto? Isto é vida? Viver ou existir? Por deveras medíocre foi tal vida estapafúrdia, alienada no fluxo do famoso "vá vivendo (vá a viver) vá seguindo (vá a seguir), pois um dia a felicidade chega!" O anestesiamento e o comodismo enterraram tal indivíduo antes do devido tempo e dentro deste havia somente um sepulcro caiado; um engenhoso Frankeinstein.
Óh, Sísifo! Condenado a empurrar tal pedra estafante até o mais alto cúme para que ela role novamente!
Que fazer? "A necessidade aguça o engenho..." como diriam meus colegas lusitanos! E então um de seus mais sublimes poetas, exaltado pelo ufanismo lusitano, Fernando Pessoa, nos diz:
"Não importa se a estação do ano muda... Se o século vira, se o milênio é outro, se a idade aumenta... Conserva a vontade de viver, não se chega a parte alguma sem ela."
E então o Frankeinstein acorda de seu mais profundo sono; e aqueles sábios que ouvem a voz da revolta contra o absurdo e abrem a porta de suas almas, são revestidos da glória do autosentido da vida.
E então ela vai a encontrar (encontrando), esta vagante alma, o que a energiza; o que a dá sentido a ponto de cumprir-se a profecia do Eterno retorno do confesso amante da vida.
Seria o hedonismo para alguns a libertação do absurdo? Uma vida de incansável estimulação dos prazeres? Que assim examine cada um em seu coração e tome deste cálice!
Seria a tremenda privação e dedicação assídua a alguma causa religiosa ou quase religiosa (como demonstrou o marxismo/comunismo, incumbido de libertar os escravos do capital e guiá-los à terra prometida da igualdade? Ou o fetichismo da meritocracia e da autoregulação do mercado que os liberais econômicos sonharam ?) Que assim examinem em seus corações os devotos de cada causa religiosa, ou semirreligiosa... e bebam desse cálice!
Seria a profunda revolta niilista (seja qual for o sentido do niilismo), principalmente o niilismo de negar que qualquer verdade possa ser alcançada?
Deste cálice assim beba, tal ser vivente!
Seria a tentativa incansável, por meio da filosofia racionalista, da tão sonhada busca da Verdade? Verdades acessíveis integralmente à faculdade da razão? Arre... já ouço Friedrich Nietzsche revirando-se em seu túmulo! Embora este jogo de brincar de atingir a onisciência seja seduzente aos amantes da filosofia.
Que também, estes, bebam de seu cálice!
Seria, então, a tentativa de viver o ideal nietzschiano? De não adotar nenhum aparente ídolo de nenhuma espécie? APARENTE, pois o próprio Nietzsche ergueu seus altares aos gregos e sua cultura suprema. Viver a vida de forma estética e com o mais profundo gosto, abraçando o sofrimento e se fortalecendo deste?
Quem assim pensa e compactua, que erga seu cálice e o beba com gosto! O cálice de Dionísio!
Portanto, caros irmãos e companheiros de jugo existencial, qual for a decisão e percurso existencial de todos os espíritos filhos de seu tempo... que seja esta decisão examinada em tais corações e, no final, beba cada um de seu glorioso cálice! Para que no final, ao acabar a ceia da vida, a morte possa consumar este momento que deva ser eterno, enquanto dura!
E assim a Morte pergunta ao peregrino caminhante: "Valeu a pena?" E ele dirá: "tudo vale a pena se a alma não é pequena!" Mesmo que as embarcações tenham naufragado e os filhos chorado; mesmo que as mães tenham em vão rezado e as noivas tenham ficado por casar! Pois os portugueses estavam dispostos a navegar o mar do desconhecido... e roubar o ouro e os recursos destas terras aqui de onde falo! A terem cruzado o bravo Atlântico com seus navios negreiros, cheios de escravizados africanos, pelos quais as tribos africanas rivais se vendiam ao aventureiro lusitano em troca de escambos. Mesmo assim valeu-lhes a pena, pois mesmo o jugo do capricho e do crime (que seja este punido pela parcial justiça dos homens) faz parte da vocação da vida! Sim, os erros! Fazem eles parte da vocação de uma vida mais que vivida!
-Gabriel Meiller
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