terça-feira, 28 de março de 2023

Os argonautas do espírito

 


Expressão cunhada por Nietzsche, um pensador humano demasiado humano como demonstra a sua vida e obra,  revela que os argonautas são aqueles navegadores do espírito; indivíduos que se refestelam no conhecimento da imensidão do espírito humano. Não só no coletivo, mas no âmbito pessoal. Veja o homem: um animal supersticioso e místico que ousou olhar para além dos instintos mais básicos e contemplar a existência de forma profunda.  Quem é um argonauta do espírito sabe que o mundo é imenso, muito mais do que a Terra; o mundo humano é um universo próprio, regido por leis próprias e sem nenhuma capacidade de ser examinado pela ciência em suas dimensões mais profundas. 


"Mundo, mundo, vasto mundo..." é o que todos sentimos e intuímos.  Nesta dimensão particular, aonde a regra de 2+2=4  não se aplica; aonde um fato tem mil faces e aonde a verdade não existe por si mesma; é nesse campo do espírito humano que as batalhas mais importantes são travadas! Como se espera que o homem cumpra a tarefa de viver em sociedade se dentro de si mesmo existem milhares desta? Suas vontades se contradizem e entram em conflito; temos multidões dentro de nós; nossa moral e nossas ações exteriores são projeções do que está "dentro". O homem é o lobo do homem, porque antes de tudo se caça dentro de si mesmo; ele se auto sabota em suas dúvidas, em sua agressividade, em sua punição vingativa de si mesmo; no desprezo a si e no ressentimento do que poderia ter sido, mas não foi. 


O homem não quer sua auto superação; quer a auto superação do outro. Este verme medroso que teme olhar para seu abismo interior  é covarde ao olhar para o outro.  A fuga de si mesmo é o maior pecado capital; o resto é um erro, uma falha, um deslize. Se o homem se encarasse como devia, chamando para si o escrutínio, a parcimônia e o desenvolvimento interno... sobraria uma ínfima preocupação impositiva ao outro. Ao contrário da cobrança excessiva do outro, a compaixão seria abundante, pois o homem que encarou a si mesmo e se deparou com a árdua tarefa de se aprimorar, sabe que com o outro não será diferente. Se a raiva e a cobrança é projetiva, que também seja em dobro a compaixão e a parcimônia. Saibam que todo narcisista olha para si mesmo de forma errada; seu sintoma é olhar sempre para si mesmo porque não olhou de forma fundamental quando devia olhar para si. Por isso o narcisista não herda seu reino, mas sempre o persegue sem nunca alcançá-lo de fato. 


Sendo assim, os únicos mandamentos humanos, demasiado humanos seriam resumidos em dois: Conhece e ama a ti mesmo em profundidade, só assim será capaz de encontrar-te em espírito e em verdade; e ame ao próximo como a ti mesmo de forma moderadamente projetiva.  "Mas e Deus?" você poderia pensar. Deus já está morto! Um ateu vive sem Deus; mas um religioso não vive sem se conhecer e se encontrar existencialmente. Sob o estigma da identidade religiosa, o homem religioso se engana porque se enxerga sob o prisma da metafísica e do olhar de um ser externo sobre si. Antes, deveria se encontrar por conta própria para depois ensaiar um encontro com o divino. Os homens fundamentalistas possuem um erro de fundação em sua natureza humana, pois caso não tenham sido antes argonautas do seu próprio espírito., nunca verão a deus. 


-Gabriel Meiller

terça-feira, 21 de março de 2023

Por que ateus e teístas têm fé? Orientações epistemológicas sobre crença, conhecimento e fé!




Nesse texto vou esclarecer e provar porque é correto dizer que os ateus têm fé na inexistência de Deus/Deuses e porque também nutrem crenças com base na epistemologia e seus conceitos básicos:

 

A epistemologia (teoria do conhecimento) analisa o conhecimento religioso, filosófico (incluindo muitos outros subtipos) e científico.  Os alicerces da epistemologia se baseiam no entendimento sobre: 1) o que é conhecimento. 2) o que é crença. 3) o que é fé.  Depois disso ocorre a análise sobre essa construção do conhecimento mediante estes elementos que estão presentes nessa construção. Então vou definir brevemente esses elementos, apoiado no livro "EPISTEMOLOGIA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS" de Paulo Augusto Seifert, que contém as noções básicas sobre a área da epistemologia:


1)CRENÇA: é algo que todos possuem, inclusive os ateus militantes que se julgam detentores do conhecimento científico e sem nenhuma crença. A crença não é vinculada ao sentido religioso somente, mas está presente em todos os elementos. Acreditamos em coisas objetivas e alvo da ciência. Para que algo se transforme em conhecimento, antes deve passar pela crença. Se esta crença possui evidências suficientes de que é verdadeira em algum momento e há um consenso, então surge daí o conhecimento.  Acreditamos que existe um mundo físico externo que não depende da nossa percepção; entretanto, esta crença não é autoevidente e não pode ser provada, mas se configura em uma convenção aceita por todos e desta crença básica surgem outras crenças pautadas nesse pressuposto, isto é, de que existe um mundo independente do olhar humano. 


2)FÉ: A fé também está presente em um ateu, visto que ela vai além da famosa fé religiosa; então é correto afirmar, epistemologicamente, que um ateu tem fé. Isto é baseado na epistemologia e nas definições filosóficas sobre fé que transcende o âmbito religioso. E o que seria a fé? Segundo o autor: "...fé seria um tipo de crença. Geralmente o termo está ligado a crenças religiosas, mas não é exclusivo delas." p. 12.  Portanto, tanto um ateu como um religioso possuem fé em algo! A diferença é apenas o objeto de sua fé. E a fé é um dispositivo que valida a crença básica, ou seja, de uma crença que não pode ser provada, neste contexto a existência ou inexistência de deuses e vida após a morte. Dessa forma: o ateu tem fé na não vida após a morte e na inexistência de divindades; o teísta tem fé na vida após a morte e na existência de sua divindade. Por conhecer este grupo, digo que alguns podem se sentir desconfortáveis  porque pensam que o ônus da prova pertence aos teístas. Entretanto, o ônus é para todos no fim das contas, visto que essas crenças não podem ser falseadas pela ciência, bem como a crença na existência da realidade externa da forma como acreditamos, bem como outras ideias não falseáveis. 


3)CONHECIMENTO: O conhecimento derivado do grego possui três acepções: 1) Doxa no sentido de opinião, baseado na experiência e senso comum; 2) Sofia, baseado na longa experiência de vida e vivências práticas; e 3) Episteme, que representa uma verdade forte, inquestionável e aceita por todos em pleno juízo não incluindo terraplanistas; episteme seria a famosa "verdade absoluta". O conhecimento possui aproximação maior com a noção de episteme nesse caso, mas passa por um gradual que parte da crença básica até as crenças que possuem evidências o suficiente para serem medidas e testadas até chegar ao status de conhecimento, como por exemplo: a noção de que a Terra gira em torno do Sol, que foi testada e corroborada pela ciência e que hoje é uma verdade inquestionável. A noção de que todos iremos morrer, também! 


Desta forma não podemos, caros colegas aspirantes ao conhecimento, tratar o conhecimento sobre todos os assuntos como "episteme" e de forma arrogante, principalmente conceitos não falseáveis e subjetivos. Podemos falar do ponto de vista de um conhecimento estilo "doxa" ou "sofia" que dão a entender que nosso discurso é passível de ser questionado e discordado. Mas o nosso instinto agressivo, mesmo em forma intelectual e erudita, nos induz a querermos destruir premissas contrárias à nossa sem ter em mente que o nosso próprio conhecimento é incerto na maioria das vezes e que está apoiado em crenças e na fé. Somos todos gigantes em pés de barro e ganhar uma discussão, como demonstrou Schopenhauer, não significa que se está certo ou que possui a verdade. Significa apenas que: somos bons em argumentação. 


-Gabriel Meiller

sábado, 18 de março de 2023

Considerações sobre o vício na busca da Verdade

 

 



O que nós procuramos além da gincana capitalista pós-moderna? O que vai além do aperfeiçoamento para o mercado de trabalho que começa na obrigação de ir para a escola e só termina na aposentadoria? Senhores, não sejamos ingênuos; todos nós já nos pegamos em  pensamentos mais profundos sobre o sentido da vida e sobre a natureza da verdade. Se regredirmos no tempo histórico veremos que havia uma explicação metafísica que definia verdades imutáveis e que faziam parte do pensamento filosófico de forma muito mais contundente do que hoje. Entretanto, houve uma cisão entre explicações metafísicas e idealistas. O homem começou a pensar de uma forma que excluísse a oposição entre o sagrado e o profano, entre forças criadoras absolutas. E então essa crise epistemológica na concepção de mundo gerou uma relativização sobre os conhecimentos filosóficos e científicos. A epistemologia moderna é uma epistemologia com uma diversidade muito grande de explicações sobre os fenômenos da existência. As perguntas mais cabeludas se pautam sobre a absolutização de alguma destas explicações. "A verdade é uma só, portanto, alguém está certo e alguém está errado." Essa linha de pensamento, fiel à concepção metafísica, nos deixa desorientados em uma "época da pós-verdade." Qual religião está certa? Qual abordagem é a melhor? O homem tem um espírito pragmático e excludente por natureza. É possível alcançar a verdade absoluta ou ela é intocável? E se a verdade absoluta for uma ilusão da mente? Um jogo teórico apenas? A verdade é o que consideramos como tal? Ou a verdade existe independente da nossa interpretação?


A insistência nessa busca pode beirar a insanidade e o desbussolamento da falta de sentido. Estamos presos, acima de tudo, na linguagem e nos enganos da linguagem. Precisamos definir e entender o que é "verdade" e o que ela significa. E depois estamos presos dentro das nossas limitações biológicas e na nossa finitude do tempo-espaço. Certamente ninguém será capaz de averiguar e bater o martelo sobre a Verdade Absoluta. A fé será uma resposta pessoal e individual, mas nada poderá garantir que ela está certa nem o que significa ela estar certa; a ciência se limitará ao que se pode reproduzir em laboratórios e em especulações físico-matemáticas sobre o universo. 


Logo, o problema não se trata de encontrar a Verdade; mas se trata de escolher um eixo, uma filosofia, uma crença, um refúgio! Se me alegra ser cristão... cristão serei; se me torno mais completo sendo um ateu, ateu serei; se minha filosofia de vida for me entregar a uma busca científica e uma vida pautada na ciência, dignificado serei por isto caso isto me apeteça. É um pacto! Uma abstenção da longa procura perambulante pela "Verdade" da existência. Escolha uma verdade, então! Mesmo que outro a julgue uma mentira e lhe chame de herege! Viva de acordo com alguma filosofia de vida, dê sentido ao que acreditas! Porque a busca não importa mais, visto que não há um achado! O achado é a preciosidade do "durante", do presente de se vivenciar a vida sem saber o que ela é! 


-Gabriel Meiller 


quarta-feira, 8 de março de 2023

Vamos surfar no hype do momento: movimento Red Pill e o paradigma de Matrix



A clássica cena de Morpheus com suas mãos estendidas contemplando duas pílulas: uma vermelha, representando a realidade nua e crua; a outra azul, representando a ilusão e a covardia diante do mundo, é muito consolidada na mente daqueles que contemplaram o impacto do filme no imaginário coletivo dos anos 2000 em diante. Essa premissa de um olhar cético, atento e disposto a sofrer pelas verdades em detrimento das doces ilusões não é nada novo. O que o filme Matrix fez, na verdade consistiu em uma nova roupagem futurista desta premissa que foi muito bem sucedida e venerada por muitos.
Mas o que o movimento Red Pill, bem como Migtow, Incell, entre outros, tem a ver com isso? Para quem não sabe, repercutiu o caso de um coaching de sedução, conhecido como Thiago Schutz em que este ameaçou uma humorista de morte pelo fato dela ter feito uma paródia dessas vertentes de movimento de homens que, em resumo, são pessimistas e desiludidos com relações tradicionais com mulheres por acharem que elas sempre serão interesseiras, traidoras, imorais e devem se submeter aos homens de valor, conhecidos como machos Alfa ou, também, Sigma, dependendo da vertente da Machosfera, isto é, da área virtual de sites e plataformas direcionadas aos homens dessas ideologias ressentidas e misóginas.
Voltando à pergunta anterior sobre a relação dos homens adeptos desses movimentos (muitos que são de um público adolescente/jovem em sua maioria) que carregam o símbolo da pílula vermelha de Matrix, podemos dizer que estes homens se apropriaram do princípio matrixiano e, ao invés das máquinas, são as mulheres que estão dominando e os iludindo. Sim, pasmem! Os homens Red Pill são como Neo, que se libertam (em suas cabeças) de um mundo mesquinho, ingrato e manipulador em que as mulheres só querem dinheiro, são infiéis e a desgraça da vida masculina. Elas são "beneficiadas" pelo sistema, visto que só precisam dizem "sim" para dormir com mil e um homens e o homem precisa se esforçar por deveras para pegar algumas dessas mulheres. Eles precisam desenvolver um bom VSM, isto é, Valor Sexual de Mercado; trabalhar muito para ganharem dinheiro e status e atraírem estas mulheres que são poligâmicas e interesseiras de forma inconsciente. Ao mesmo tempo as mulheres são um troféu rivais destes, pois eles lutam por elas e contra elas em suas mentes "libertas" pela pílula vermelha! Será que esse pessoal não parou para pensar que o "privilégio feminino" de estar "por cima" acontece justamente por estes homens alimentarem isso e serem "escravocetas"? Isto é, o sistema de homens que fazem parte de uma cultura patriarcal que trata as mulheres como objetos e troféus! Estes homens, portanto, não correm atrás de mulheres, mas de seus desejos mesquinhos de alimentarem seus egos de forma ridícula para se reafirmarem como pegadores. Já viram isso em algum lugar? Sim! No público deles: a quinta série!
Certo... mas e os homens que não concordam com estas premissas? Ah, simples! Estes recebem a alcunha de Bluep Pills; os Blue Pills são homens iludidos que ainda não se libertaram da ilusão de que a mulher não é um gênero traiçoeiro e duvidoso. Os Blue Pills são rotulados como emocionados, românticos, fracassados e pessoas à beira de levar um chifre e um pé na bunda a partir do momento em que suas mulheres encontrarem um cara melhor, mais rico e com maior VSM do que estes, pois "é da natureza da mulher fazer isso" por conta da "biologia evolutiva". Eis aí mais um erro destes movimentos: pegarem pressupostos de uma ciência séria e distorcê-los em suas aplicações para que essa pinçagem a gosto fomente suas visões de mundo deturpadas. Os princípios morais, emocionais e a construção social e comportamental é diminuída e subestimada para que eles apliquem nas mulheres essa tese pseudo-biológica/evolutiva.
Desta forma, a desilusão amorosa e as dores da rejeição de muitos desses influenciadores Red Pills são o motor para que embarquem nestas jornadas de consolo ressentido. O que Nietzsche diria destes e disse dos ressentidos e do "fraco em oposição ao forte" em sua obra? Ele asseverou que os fracos são aqueles que olham os fortes e os culpam por suas fraquezas ao invés de lutarem; os fracos, em suas fraquezas, olham para o forte e buscam culpá-lo e invalidá-lo por ofuscarem estes fracos. Em resumo seria: "Hey, mulheres! A culpa é do seu gênero pelo fato de eu ter sido traído ou trocado por outro homem, afinal, vocês todas não prestam." Verifiquem o histórico destes coachings Red Pills e de outros movimentos e verão que a esmagadora maioria são homens frustrados e que tiveram péssimas experiências amorosas e generalizaram estas experiências. Vejam a repercussão do "Calvo do Campari!" e entenderão os fenômenos psicológicos e psicanalíticos por trás destes movimentos de forte cunho político-ideológico como uma reação ao movimento feminista.
Em resumo: os fracos, dentro do ver nietzschiano, são aqueles que culpam o seu entorno por suas fraquezas e não assumem que a responsabilidade compete a eles e não na transferência de culpa aos terceiros. Com isso eu não estou dizendo que o gênero feminino é bom ou ruim; sabemos que estas definições qualitativas são bobagens duais e simplistas demais, visto que o bom e o ruim são relativos e estão em ambos os gêneros. Existem homens e mulheres ruins e bons; fiéis e infiéis, que fazem partes de movimentos extremistas ou mais sóbrios. Desta forma, os Red Pills na verdade são Blue Pills, pois preferem ficar em suas ilusões pessimistas e ressentidas "confortantes" aos seus olhos. Mais confortantes do que o trabalho de ter que encarar a realidade: talvez eles tenham errado tanto quanto as mulheres que os traíram e os deixaram no altar ou no Reality Show (no caso do Calvo da Campari); talvez eles sejam péssimos como namorados, amantes ou paqueras. Talvez não saibam sentar e conversar de forma pacífica, sem reafirmações e sem deboches infantis. Não tomaram verdadeiramente a suposta "pílula vermelha". (Ps: se alguém quiser compartilhar o texto, copiem e colem no mural de vocês, pois o grupo não permite compartilhamentos externos).
-Gabriel Meiller

quinta-feira, 2 de março de 2023

Os velhos e viciantes assuntos filosóficos

 


O que dizer sobre o "mais do mesmo?" O mais do mesmo será sempre preferido pelas reações previsíveis e primitivas que este mesmo sempre desperta. Deus(es) existe(m)? Ou a vida após a morte? Idolatramos a ciência e colocamos ela em um pedestal, ou desprezamos a ciência por ela mostrar nossa imaturidade de crenças metafísicas? Nietzsche é um falastrão e sedutor e a Bíblia um livro sóbrio e sábio, ou Nietzsche só disse o que muitos não tiveram coragem de falar e foi odiado pela carolice ocidental? Psicanálise é ciência ou pseudociência visto que possui muitos tópicos não falseáveis e sem comprovação experimental? Freud exagerou na ênfase do impulso sexual e no complexo de édipo ou Jung errou ao conceber a energia psíquica de forma abrangente até chegar ao inconsciente coletivo?  As pautas políticas não serão abordadas por questão de censura prévia, mas elas também entram nesse pacotão de divergências intelectuais que podem desembocar em agressões físicas e ânimos exaltados. 


Bem... decidi trilhar um caminho diferente destes. Aprendi a conviver com a dúvida, debochar da razão linear e da rigidez epistemológica. Neste famoso "mundo, mundo, vasto mundo..." eu não terei rima, muito menos solução; meu brilhantismo não passa do mediano, portanto, não é brilhante. Mas minha visão é lúcida e humilde no sentido de reconhecer de forma realística minhas qualidades e defeitos. Essas questões antigas nunca tiveram solução; muitas respostas aparentemente contraditórias se complementam quando a visão pequena e mesquinha é expandida com a reflexão aberta e desinteressada em defender um lado: muitas verdades são verdades dentro da religião ou em formato de teoria científica. Muitas verdades são verdades fora das considerações e investigações científicas, incluindo pressupostos pseudocientíficos.  O próprio conceito de ciência, aliás, depende da orientação epistemológica e da avaliação de simpatizantes dessa ou daquela orientação. Carl Popper ou Thomas Khun?  Ciências formais, biológicas ou sociais? (Parece que rimei agora, mas nada solucionei). 


Enfim... teimamos no ímpeto de resolver equações de um mundo complexo, irracional e incognoscível, por meio de fórmulas da razão ou da paixão. Não iremos! Sempre haverão os alienados na ciência, na religião, em teorias da conspiração, na busca de prazeres sensoriais, entre outros. Mas como iremos viver e utilizar a vida, seja lá o que ela seja? Viva. Se te apetece discutir, discuta. Se quiseres defender um lado por ele te fazer sentido, defenda com unhas e dentes! Mas saiba o que te apetece e o que te faz olhar para trás e dizer: eu vivi! Não fiquei oco e vazio por dentro e não deixei os anos pesarem a tal ponto de desfalecer da vida e apenas sobreviver. 

-Gabriel Meiller

O papel da psicanálise na epistemologia científica e a rixa entre as ciências

     


A mente humana é muito intrigante. Começa pelo fato dela não ser palpável, localizável ou testável. Deve ser por isso que a psicanálise é evitada e receada por muitos cientistas que só consideram a experimentação e a total falseabilidade de um conceito (de preferência com uma reprodução em laboratório) como algo digno de ciência. A psicanálise, neste sentido, é uma epistemologia misteriosa, intrigante e sem um rótulo adequado nem de ciências biológicas, formais, e também nem de ciências humanas. Ela estuda o território empírico da mente através da observação indireta, isto é, pelos relatos dos pacientes e dos sintomas da mente neurótica ou psicótica. A estruturação do inconsciente como um conceito psicanalítico provocou a tão comentada terceira ferida narcísica na humanidade e conferiu à psicanálise um estatuto de análise da análise, ou de analista do analista. Por quê? Porque se o inconsciente rege nossa investigação, esta investigação pode estar enviesada e corrompida por fortes paixões. Não podemos dizer que existam imparcialidades, mas  sabemos que é imprescindível saber quais são nossas paixões e tendências dentro de uma tentativa de se fazer ciência para que os excessos não sejam cometidos e a arte da nuance na investigação científica seja beirada em algum momento. 


A psicanálise desafia a ciência neste sentido? Sim! Quer seja ela ciência ou protociência, ela desafia o cientista e a produção do cientista. Através de uma análise que envolva reflexões históricas e filosóficas das ideias científicas, conseguimos entender como os cientistas querem enxergar a si mesmos, à ciência, e ao mundo e seus fenômenos. A ciência e seu corpo epistemológico possui tendências e análises que obedecem princípios que são ideológicos também.


 De forma mais sutil e crítica que as ideologias não científicas, pseudocientíficas e metafísicas, mas ainda são parciais. Os teóricos da epistemologia científica possuem os conceitos do que seria a tal da ciência e estes conceitos divergem em alguns pontos. As ciências biológicas possuem sua forma e seu crivo em se fazer ciência, mas existem ciências que fogem de um cunho fortemente experimentalista, pois suas análises não podem ser testadas de formas diretas. A história e a psicanálise são as mais árduas e talvez desconsideradas pelos cientistas mais radicais e experimentalistas. A psicanálise ainda mais, recebendo a alcunha de protociência ou pseudociência por muitos sujeitos. 


O que dizer disto? O imperialismo subcientífico cegou alguns e inflou a muitos; existe uma rixa dentro da própria ciência. Por que em alguns aspectos os cientistas se comportam como os grupos religiosos em diferentes vertentes de uma mesma religião? Porque incrustado em seus DNA's, antes do papel científico, prevalece o instinto de grupos e de divisão por grupos. 


Embora não admitam: nos escombros, nas sendas mais profundas de seus corações, os cientistas veneram seus ídolos assim como o crente adora seu deus. Mas isto é inescapável, visto que a veneração e a divisão de grupos faz parte do ser humano e de sua natureza parcial. De modo nenhum encorajo a fuga dos grupos e das parcialidades, mas defendo a consciência de que estamos dentro destas venerações e destas parcialidades de julgamento para que não sejamos munidos de julgamentos e acusações hipócritas aos que não fazem parte de nosso grupo e tenham outra orientação epistemológica.


-Gabriel Meiller