Mais do que as ideias em si mesmas, carece-se de artesãos eficientes que sabem podá-las. O mundo clama por pessoas que ultrapassem o dogmatismo inebriante. A paixão é famosa entre todos por ser um ente que nos cega para os defeitos daquilo que se é venerado. O apaixonado torce seu senso crítico e busca o engenho para que suas ideias caibam no mundo de forma integral. As ideologias são essa famosa lente que distorce o mundo e o idealiza para que ele sirva às expectativas do apaixonado. "A ideologia", certa vez entreouvi em algum lugar imemoriado, "... é o cadáver da filosofia." Isto significa que a busca pelo senso crítico é sufocada pela ideologia sob a esperança de que os fins justificarão os meios, inclusive por meio do sufocamento do senso crítico e das amarras imputadas ao livre questionamento.
Então a filosofia, morta por sufocamento, vira um cadáver chamado: ideologia. Já sem vida, a filosofia ainda é vista como tal por nós ingênuos, que defendemos com gosto e acariciamos nossas paixões ideológicas. A verdade? Ela só vale se estiver de acordo com nossas crenças, caso contrário é um meio que não justifica o fim desejado.
Coloquemos em voga o exemplo político: aqui temos os que defendem as ideologias progressistas de esquerda e que valorizam os seguintes tópicos: coletividade, igualdade, controle estatal, pautas de ideologia de gênero e a luta pelo respeito à diversidade. Todes es progressistes defendem um mundo em que a acumulação de capital seja extinta ou minimizada ao máximo possível.
Acolá, à direita, temos os que valorizam: a propriedade privada, a individualidade, a meritocracia que se opõe a igualdade artificializada pelo Estado; a desestatização, diminuição dos impostos e o controle privado em muitas áreas (mas não nas mais essenciais como saúde, educação e segurança) e pautas religiosas e sobre a família tradicional.
Ambos os ideólogos estão comprometidos com suas paixões mais do que a verdade e por isso colocam suas lentes cadavéricas e se recusam a tirá-las. Abominam o "talvez", sendo idólatras de suas verdades dogmáticas. O esquerdista usa pautas coletivas e força a militância para causas pessoais e autopromoção. Junta-se o melindre de uma geração que nasceu em meio às facilidades da era digital com a disposição militante-progressista e então o mundo precisa se curvar a estes e serví-los. O direitista deposita a idealização de que o Estado deve ser feito para ele: não deve gastar com projetos sociais, arrecadar a menor quantidade possível de impostos "desnecessários" pelo fato de não serem serviços direcionados à sua classe econômica. Um bom estado para este meritocrático que conseguiu tudo pelo berço é aquele estado econômico e minimalista. Para ele tudo é "mimimi", visto que nunca passou por apertos financeiros, demandas intermináveis e cobranças de superiores.
Então, quando as lentes são amplificadas por meio da extrema direita e extrema esquerda... os mundos são incomunicáveis. O diálogo é encerrado e ambos os ideólogos se relacionam com as fantasias que produzem do outro: o outro é mau, o outro é burro, injusto, cego e mentiroso. E então o cadáver da filosofia, isto é, a ideologia... é envolto em um caixão alienante, chamado: bolha social. Uma bolha social é um isolamento cruel ensimesmante, um conjunto de narcisistas assassinos do senso crítico, quase canalhas. Não digo que sejam canalhas porque são apaixonados e deduzo que todo apaixonado não pode ser canalha, a não ser um canalha como meio para se chegar ao fim desejado. Mas o canalha em si é um desapaixonado que faz canalhices por belprazer.
Quem são os canalhas? Os políticos. Esses são verdadeiros profissionais que encenam seu culto ao cadáver da filosofia, mas na essência só se preocupam com o dinheiro no bolso: o dinheiro desviado dos impostos, todos sabem. No final das contas uma verdade filosófica e empírica, que se distancia muito da ideologia, eu lhes trago: os canalhas podem ser tudo, menos trouxas. Os trouxas são os ideólogos, enquanto os canalhas: bon vivants muitas vezes à prova de karma.
-Gabriel Meiller
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