quarta-feira, 5 de junho de 2024

O excesso de ideologia como vício identitário

 


Um punhado de ideologia e o bando se reúne; dois punhados de ideologia e ele se secciona em guetos. Ideologia é o cadáver morto da filosofia e o niilismo a esperança de quem teve relações sexuais com esse cadáver. 


O niilismo é a negação da vida e o desprezo dela por inúmeras formas criativas. Já repararam no homo-ideólogos? Ele examina bem cada palavra, cada confissão que o outro faz e se atenta a repreendê-lo como um fiscal epistemológico, como um cão de guarda da Verdade. Mal sabe ele que vive pela sua verdade, enquanto os outros vivem pelas demais e isso nunca mudará. Aonde está a verdade verdadeira e quem pdoe defini-la? A incapacidade de responder essa pergunta sem soar ridículo demonstra a fragilidade do homem diante da existência como uma complexidade epistemológica irreconciliável. 


O ideólogo cai num tipo de niilismo bem peculiar, como se fosse uma mistura entre o ativo (a reafirmação de uma ideologia) e o passivo (negação de todos os demais ideais que não coadunam com esse ideal). O ideólogo torce os conceitos na maioria das vezes para que eles caibam em seu mundo idealizado que prega sobre "como o mundo deveria ser".   E então a filosofia como postura cética que questiona para se aproximar de alguma intuição/noção (mesmo que subjetiva) de "verdade",  é sacrificada em prol de um bom motivo para se morrer, como diria Albert Camus. Pois um bom motivo para  viver, também é um bom motivo para se morrer, ou melhor, para tirar a própria vida em ato de desespero. 


Mas para que tanta ideologia? Alguém perguntaria, desconfiando que no fundo sabe e também pratica isso. E a resposta ressoa de dentro: para sua autoafirmação diante do mundo! Seja uma ideologia por meio de argumentos racionais e eruditos, seja uma ideologia encarnada em práticas concretas que exibem força, poder e autoridade. "A vida é vontade de poder", disse Nietzsche. O que é a vontade de poder? Ela significa literalmente: um desejo ativo de poder fazer algo, isto é, colocar sua vontade, seu controle no mundo, alterando a realidade. O ser humano gosta da sensação de controlar e modificar o mundo, assim como um artista gosta de esculpir/criar algo e ver o quão prazeroso isso foi pelo fato de ter sido obra sua! 


Essa vontade de poder, porém, faz da humanidade o que ela é: uma luta de forças constantes e contrárias. Aos ideólogos que insistem em fazer da humanidade um lugar melhor, desejo-lhes força para vencer as próprias frustrações decorrentes do adiamento constante e infinito dessa esperança provavelmente ingênua. A humanidade com sua teimosia tem muito mais a ver com apreciação, choque, espanto e admiração do que: controle, luta de classes, transformação, etc. A humanidade é o feitiço lançado pelo feiticeiro e que saiu de controle há muito tempo


-Gabriel Meiller.

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